Toda a gente sabe que a Tua Vinharia é de um casal, mas quando precisam de dizer a alguém onde vão – sim, é muito normal as pessoas darem satisfações da sua vida umas às outras – referem que vão beber um copo, ou comprar vinho ao Jaime. Nunca ninguém vem à Calita, acho eu.
Obviamente, esse assunto já deu azo a discussões, amigáveis e não só, sobre machismo, patriarcado, necessidade de protagonismo e etc. (e nós somos tão bons nos etceteras! Eu diria que a nossa capacidade de passar de uns assuntos para os outros é quase imbatível), mas é natural que, sendo o Jaime a pessoa que está mais vezes à frente da loja, seja ele o nomeado.
O que eu ainda não tinha notado é que também nós fazemos o mesmo: vamos jantar ao Sr. António, almoçar ao Helder, comprar papel higiénico à Cláudia, mas neste caso o minimercado também se chama Cláudia, experimentar um casaco na Sandra, comprar gás à Rosa e carne ao Lino. Eu não sei se tem a ver com o grau de intimidade que se vai ganhando com as pessoas dos sítios que frequentamos, ou se é um hábito comum das cidades pequenas, o facto é que toda a gente o faz.
Acho que a excepção, no nosso caso, é o Bicho, porque eles são mesmo uma equipa e são de outra geração e agora podia começar outra vez com a história do patriarcado, mas vou calar-me, porque onde eu quero chegar é, curiosamente, ao passado.
No meio de uma investigação que comecei a fazer, por causa de uma história que ando a precisar de contar, há demasiados anos, descobri que tenho uma tataravó (nunca pensei alguma vez precisar de escrever esta palavra) que era taberneira.
Sim, eu tenho uma antepassada, nascida no ano de 1803, que vendia vinho, em Laúndos, e chamava-se Joanna Maria Salvadora. Como se não bastasse a coincidência de eu ter vindo parar ao sítio de onde sempre quis fugir para vender vinho, ainda tenho uma tataravó que fazia o mesmo, com o detalhe maravilhoso de ter no nome o epíteto perfeito para os necessitados de poesia.
Será que as pessoas, isto é, os homens, diziam que iam matar o bicho à Joanna?
Calita
